classroom in a university
Photo by Shubham Sharan on Unsplash

Propostas para a Unicamp(Eng. Computação)

Raissa Correia

--

Eu sonho em escrever esse texto desde 2019 quando estava nos últimos meses da minha graduação, porém a vida me atropelou e deixei isso quieto, nesse meio tempo houve uma pandemia e muitas das minhas reflexões começam a se tornar realidade, foram duramente impostas sobre educadores e alunos em uma realidade que não estava preparada para isso, porém ainda vou finalizar esse texto, pois algumas coisas ainda não mudaram.

Faço um adendo que trabalho na área de software aplicado a educação desde quando comecei minha carreira há quase 4 anos e hoje vejo a área da educação como uma área não revolucionável, e o que quero dizer com isso é que não haverá nunca um método ou técnica que é A solução.

Construir uma educação melhor do jardim de infância até a pós-graduação envolve um processo árduo profundamente psicológico e social da relação entre alunos e entre aluno e professor. Não é um feito técnico. Normalmente o que mais ajuda numa criança e adolescente a ter uma educação melhor é uma boa infraestrutura, poucos alunos por professor e pais com maior educação, criando o problema do ovo e da galinha que precisamos de muita mão de obra qualidade e investimento para criar mão de obra qualidade que vai prover dinheiro para ser investido, e cada geração em cada família se supera um pouco mais.

Vejo que os principais gargalos que soluções técnicas de qualidade podem aliviar é:

  • dar mais tempo para os professores fazerem o que fazem melhor, a pedagogia, e ter atenção ao aluno.
  • prover ao aluno uma diversidade de materiais e projetos para que naturalmente engaje tanto com o conteúdo, quanto com seus colegas, levando em conta que cada um tem suas individualidades e aprender de um jeito distinto

Levando isso em conta, meus pontos, que ainda não foram feitos no pós pandemia são:

I — Teoria remota, presencialmente só mentoria!

Uma das coisas que mais sentia falta na graduação, e espero que tenha mudado com a pandemia é que o ensino teórico, a introdução de um conteúdo a um aluno que nunca viu deve ser feito remotamente e não com alguém palestrando presencialmente. De preferência com vídeos e livros em casa sozinho. Os motivos para isso são:

  • cada um aprende de uma forma muito própria, quase que um traço de personalidade, uns preferem vídeo, outros texto, alguns preferem ouvir e ler antes de praticar, outros preferem fazer junto e consultar sob demanda.
  • aula presencial nunca terá a qualidade de uma aula gravada. Justamente pelo poder de ouvir de novo, de acelerar quem fala mais lento e dar mais dinamismo, de objetivar e reduzir um conteúdo de 2 horas para 30 minutos e criar recursos mais elaborados como animações ao invés do texto na lousa e realizar exercícios, anotações e pausas conforme o indivíduo ache necessário.
  • ao deixar o processo de aprendizado para antes da aula, e deixando claro que presencialmente a ideia é mentoria, discussão sobre o tópico, ajuda com trabalhos ou projetos e colaboração, permitindo imitar de forma mais fiel um ambiente tanto de pesquisa quanto do meio corporativo.
  • ao deixar o presencial para essas trocas mais ricas, respeita-se o tempo dos alunos que trabalham enquanto estudam
  • isso prioriza a estrutura da universidade para priorizar infraestrutura de produção, laboratórios, bibliotecas, espaços de uso comum para além de salas de aulas que dominam a metragem construída, especialmente nas universidades menores e privadas.

II — Foco na prática em toda e qualquer matéria

Há cursos que o conceito de “prática” vs. “teoria” é complicado, por exemplo matemática pura. O que eu quero dizer com teoria é o ato de absorver o conhecimento passivamente, com o tripé livro-texto(ou slide), aula presencial no estilo palestra e prova.

Esse tipo de disciplina existe com o propósito de poder avaliar cada aluno de forma justa, afinal em grupos é extremamente comum um ou uma minoria carregar o resto do grupo, além do esforço de criar projetos e julga-los cada vez demanda mais do avaliador que em geral não tem muito tempo para isso devido ao fato do professor ser também um pesquisador.

O foco na prática é portanto um pedido para que a estrela da disciplina não seja o ato de passar numa prova mas sim aplicar o conhecimento em projetos, o que felizmente já tem melhorado conforme a graduação foi chegando ao fim, no entanto para isso ser possível falta uma reflexão sobre projetos e o ato de avaliar.

O maior gargalo para isso é: como engajar os alunos a serem proativos e não serem carregados pelo grupo? Como criar um sistema em que trabalhos em grupo podem ser individualmente avaliados? Como aliviar a carga do professor para ele estar atento a isso?

A resposta para a última é que com o tempo original da aula palestra os trabalhos podem ser feitos e o professor pode assistir e ficar de olho nos grupos.

A primeira é que engajamento é criado pelo ambiente do grupo, há monitor ou professor e há uma meta a ser feita e entregue num prazo curto(o momento da aula) e uma realização imediata de todo mundo de missão cumprida por hoje.

A segunda é a mais difícil e tende a ser mais técnica, aplicando métodos que as próprias empresas usam para avaliar empregados, combinado com a psicologica do ensino, pois numa universidade se ele está lá é porque quer aprender aquele tópico(ou precisa de alguma forma) e se ele fracassa há uma razão ou na vida do estudante, ou na forma como ele foi previamente educado(e não sabe aprender), ou o professor está falhando.

III — Quais projetos e como avaliar?

É difícil avaliar a participação em projetos porque faltam as métricas e faltam ideias de bons projetos que ficam para a universidade para usufruto dos alunos nos anos posteriores, para criar um senso de produtividade e pertencimento maior.

Projetos como: software open source, artigos da wikipedia, vídeos, animações, provas com resposta(quizes), pequenas aplicações criativas, que apesar de não tão valiosas são significativas, como a aplicação daquele conhecimento num setor e aproximando assim o curso do estágio e do meio empresarial.

Além disso sabemos que o processo de aprendizado não é seguir roteiro mas sim, tentativa e erro, trocar ideias com os colegas sobre o que nem vale a pena ser tentado e entender como as coisas devem ser feitas, o jeito mais prático e eficiente e porque este método é o mais eficiente

Para isso faltam métricas para avaliar a contribuição do estudante nesse novo cenário de escopo bem mais aberto, e essa é a discussão que deveríamos estar tendo enquanto educadores.

IV — Para tais projetos “reais” falta conhecimento real

Git, Docker, Maquinas Virtuais, Gestão de Projeto, Teste, QA, UI/UX!
Eu não vi nada disso na minha graduação, no entanto todos esses itens são primordiais em qualquer empresa séria de TI.

A pergunta que fica é porque a graduação não me ensinou isso? Isso evitaria que os professores sofressem tanto com as correções, para este item nem tenho o que acrescentar a não ser deixar meu argumento que tais assuntos devem ser incluídos naturalmente conforme a demanda pede ao introduzir o conhecimento de programação. Git seria dado de imediato, junto com venv para viabilizar trabalhos e oficinas em grupo, Docker poderia deixar para o final do 2º ano ou 3º.

V — Quem ensina e quem aprende?

Monitores, alunos da pós, pessoas de fora da universidade, professores, pesquisadores, é um ecossistema novo que precisa ser criado.

Na minha visão a maioria dos professores da Unicamp em suas atuais funções estão “matando mosca com tiro de canhão”. Muitas vezes alunos da pós tinham uma didática muito melhor e na época pude entender com mais facilidade com esses PEDs(os alunos da pós que são monitores de uma disciplina), especialmente porque a aula com o PED costuma ser de prática e revisão e ele foi um aluno há muito menos tempo.

O professor é alguém muito diferente de um pesquisador, e um professor da pós, orientador de TCC, um do início da graduação são trabalhos com perfis distintos.

Não precisamos de um seleto grupo professores extraordinariamente inteligentes. Precisamos na realidade de uma fabrica de conteúdo, de propostas de avaliação, atividades e avaliações dessas atividades. Todos em larga escala.

Vale dizer também que a maior parte do custo da educação são funcionários, incluindo professores, então essa proposta também tem um viés de ajudar a universidade a alcançar uma eficiência maior no uso de seus recursos.

Na seção VII explico melhor sobre quem ensinará no final de contas.

VI — O sistema S das universidades

Eu gosto muito do sistema S, especialmente porque meus pais são sócios vitalícios do SESC e passei a infância e adolescência indo neles e as vezes no SESI. O sistema S cria um incentivo para trabalhadores contribuírem para uma infraestrutura de lazer em comum, e as universidades deveriam ter tipo um SESC ou SESI, explicando…

Imagina uma instituição de lazer em que todos os estudantes de universidade pública contribuem após se formar, e ao contribuir todos eles podem frequentar universitários atuais e contribuintes, eu aplicaria isso a todas as universidades públicas e privadas, e todos os níveis de curso superior e de pós dos tecnológicos até o Phd. Proporcionando os seguintes benefícios:

  • Aproximar os estudantes dos seus colegas de profissão desde o início e fazer com que eles conheçam melhor aonde podem atuar ao conversar com veteranos de 5, 10, 20 anos acima
  • Proporcionar uma estrutura de lazer melhor aos universitários o que ajuda nas questões de saúde mental e física dos mesmos.
  • Tornar o Brasil um país mais competitivo no cenário esportivo internacional partindo das atléticas, e também aproximar o povo da universidade através do esporte.

Pode parecer abstrato pois as pessoas não contribuiriam, mas eu diria que muitos poderiam uma vez que a ideia se mostrasse sólida e saísse do papel com um investimento inicial nessa estrutura nas melhores universidades do nosso país. Uma quantidade grande de alunos paga para ir numa academia, e elas são populares nos arredores do campus, então a demanda existe.

VII — O intercambio com a sociedade que todas essas medidas juntas criariam, muito maior do que temos agora, a conclusão

Ao aplicar as medidas de 1 a 6 criaríamos um novo ambiente nas universidades, muito mais próxima da sociedade. Com uma plataforma online para pessoas submeterem cursos(afinal temos cursos e bootcamps surgindo toda hora), materiais, provas, correções, em troca de pagamento caso seja aprovado por uma comissão, qualquer um pode fazer o trabalho “chato” do professor.

Logo isso evoluirá para uma profissão de fato, da mesma forma que Uber foi de economia de compartilhamento para taxistas profissionais, pois para maximizar ganhos e valer a pena viver disso surge naturalmente especializações.

Isso irá liberar os atuais professores para orientar pós-graduandos, liberar pesquisas, escrever papers, fazerem divulgação de seu trabalho. Também libera para monitores(que também teriam formação de professor) para dar atenção total as atividades em grupo dos alunos como gestores numa empresa. Inclusive podem ser alunos do doutorado remunerados para isso já que o estado tem extrema dificuldade em pagar bolsas decentes a eles.

Concluindo

Essas são minhas sugestões, talvez futuramente adicione mais itens e ilustre o texto, quem for da área e quiser fazer uma critica construtiva ou ajudar a tocar essas medidas só falar na DM do meu Twitter, que está na bio. Obrigada a quem leu até o final.

--

--

Raissa Correia
Raissa Correia

Written by Raissa Correia

Just a brazillian fullstack dev @raideveloper on twitter and instagram

No responses yet